Manifesto da V Andaina pola protección da serra do Galiñeiro.

13 Mai

Entre Vigo, Gondomar, o Porrinho e Tui alça-se a serra do Galinheiro, um terraço para admirar o Atlântico e também as terras do interior, com a forma duma crista de galinha a setecentos metros sobre o nível do mar; um lugar duma beleça delirante, onde ascendemos lentamente, não tanto por ser difícil o acesso como pelo facto de que o caminho bem merece deter-se a contemplar a paisagem, a colher folgos para uma subida continuada, que tensa os nossos músculos com um esforço semelhante ao da pura existência. Esta serra permaneceu quase igual durante séculos. De velhos a crianças, gerações e gerações puderam viver percebendo essa montanha que acompanhava, que presidia cada momento, que desenhava a fotografía de fundo das suas vidas.

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Esta montanha é alta, muito alta. Altíssima. Sobretudo para nós, os animais com duas patas, porque comparada com outras no mapa é bem pequena. Mas, para alén disso, a montanha é magnífica. Quero dizer que possúe um ar de dignidade, de grandeza. Se calhar todas as montanhas têm esse aspeto régio, próprio de quem sabe do seu poder, de quem pode enjergar mais lonxe que o resto… Não é que eu tenha viajado muito mas pelo que tenho visto, há montanhas por toda a parte e todas são parecidas. Todas são sólidas, estáveis, como mães que nunca abandonam, que aguardam o retorno. Sim, todas as montanhas são sólidas, estáveis. Bem o sabem por aqui. Esta é espetacular. E tem essa concentração no que é essencial. A montanha é sempre rigorosa. Não permite luxos. Nem complicações. Por isso agora, quando os poderes económicos tentam fazerse ainda mais ricos colocando eólicos nesta paisagem, a montanha mesma parece estar a bruar, como se quisesse remexer-se do sítio e mudar para outra parte, de tão incômoda. Ainda bem que não tem patas, que nesse caso igual marchava. Querem enchê-la com muínhos de vento que estraguem a sua beleça. E a montanha poderia consentir que a afeiassem sem mover-se, assim são as montanhas. Quererám fazê-lo, aliás, sem deixar a riqueza energética aquí, mas levando-a a outros países, a encher os petos já bem cheios de alguns. Nnem isto mesmo chega. Também querem furá-la para procurar as terras raras, os metais com que fabricarem tecnologias de última moda. Querem acabar com a montanha e que a gente fique calada.

Por isso, algumas iniciativas populares, como a Plataforma para a defesa da Serra do Galinheiro levantam-se em contra deste abuso. Para defendermos a Serra do Galinheiro. Porque na Galiza, não nos satisfaz um futuro condicionado aos poderes econômicos do capitalismo que destruam a natureza e a considerem um simples recurso de que nos servirmos esmagando tudo ao nosso passo. As nações não são unicamente laços históricos. As nações são também espaços físicos povoados por bichos que se movem dum ao outro lado. As nações são paisagens. As nações são os materiais inertes das rochas que constituem finalmente a matéria de que estão feitos os nossos corpos e para os que, no entanto, às vezes não temos outra palavra senão “recursos”, bem indicativa de estarmos a participar da secular óptica de domínio contra a que agimos como ecologistas, ou como pessoas minimamente interessadas em deixar a quem venha detrás um mundo natural, se não tal e como o conhecemos, sequer vivo.

Os incêndios que assolaram estas terras tantos verãos, a ameaça das canteiras e agora das explorações mineiras fazem-nos chorar a paisagem porque somos parte dela, porque somos biosfera, porque vivemos corpo a corpo com a terra. Nesta altura parece evidente que devemos libertar a natureza, que devemos conceder-lhe também ao território esse status de autodeterminado, soberano e livre do dente do capital: os rios, as criaturas que pululam arredor de nós, os mares, as montanhas, as minas, as reservas energéticas e as fragas precisam ser libertados. A memória do Nunca Mais está tristemente connosco: as sentenças podem exculpar os estados mas a ferida da destruição, uma vez consumada, fica para sempre.

Talvez já escutaram falar do caso do povo Sherpa de Beding, a 3700 metros sobre o nível do mar no estado de Nepal. Nos anos ’70 tiña só 150 habitantes. Embora as difíceis condições de vida e a escaseza de poboação, o seu mosteiro era formoso e mantínha-se conservado por numerosos monxes. O seu trabalho tinha un significado religioso e artístico. Ao lhes perguntar se prefeririam o dinheiro das expedições extranjeiras que subissem à montanha ou a montanha preservada tal qual era, as 46 familias deram o seu voto à conservação. O governo central de Nepal e as asociações de montanheir@s do mundo, no entanto, não simpatizaram com tão exquisita idea: protegerem uma montanha? O governo pensava no progresso, os montanheiros na sua conquista e finalmente as necessidades culturais da comunidade não contaram. Mas isso não significa que a comunidade não soubesse para onde queria caminhar. Ecologia é utopia porque sem utopia não se poderia entender que ninguém se opusesse a uma grande companhia, como também não se entenderia que ninguém se pusesse a andar de bicicleta e abandonasse o carro, porque sem utopia ninguém se poria a lavar cueiros em vez de assumir o consumo de celulosa, já tão arraigado. Neste ponto é indispensável acordar as conciências durmidas que não advertiram ainda a gravidade e a urgência dos problemas. Toda dificuldade ha-se ver superada quando se forme uma massa crítica com a vontade necessária para transformar. E uma transformação radical pode ser perder a arrogância de imaginar que a natureza deve estar sob a nossa mão, que é mão de ferro.

 

Por uma serra do galinheiro livre e digna. Em maio de 2014.

 

Teresa Moure

2 Respostas to “Manifesto da V Andaina pola protección da serra do Galiñeiro.”

  1. Ramón Anxo Martíns Seixo 16/05/2014 ás 9:04 pm #

    Lástima que este texto tan fermoso non se lese o día da camiñada para que tod@s @s que estabamos alí o puidésemos escoitar.

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